Rim transplantado duas vezes trouxe avanço médico, dizem cirurgiões (DR)
Pela primeira vez, um rim foi transplantado em dois doentes – contando com o dador, passou pelo corpo de três pessoas. A história mostra que em alguns casos é possível voltar a transplantar um órgão.
O caso vem relatado esta quinta-feira na revista New England Journal of Medicine, e ontem os três “proprietários” do rim encontraram-se todos pela primeira vez.
Ray
Fearing, de 27 anos, residente em Arlington Heights, perto de Chicago,
sofria de uma glomerulonefrite segmentar focal, doença caracterizada
pelo desenvolvimento de tecido cicatricial na zona que filtra o sangue
nos rins e que leva este órgão a entrar em falência. A irmã, Cera
Fearing, de 24 anos, doou-lhe (em vida) um dos seus rins, em Junho do
ano passado. No entanto, poucos dias após o transplante, os sintomas da
doença reapareceram em Ray Fearing: os médicos do Hospital Northwestern
Memorial, em Chicago, informaram-no de que tinham de lho remover, caso
contrário a sua vida estaria em risco.
“Em 50% dos casos, o
transplante não trava a progressão da glomerulonefrite segmentar focal”,
explica Lorenzo Gallon, director do programa de transplantes renais do
Hospital Northwestern Memorial, citado num comunicado da sua
instituição. “Quando os exames pós-cirurgia indicaram que Ray corria
perigo de vida devido ao reaparecimento da doença, tivemos de remover o
rim antes que se deteriorasse."
No entanto, o rim ainda era um
órgão relativamente saudável e viável. "Podia ser transplantando em
alguém que não tivesse glomerulonefrite segmentar focal”, acrescenta o
médico, que é um dos autores do artigo publicado nna revista médica
norte-americana.
Duas semanas depois do primeiro transplante, o
rim passou para Erwin Gomez, de 66 anos, um cirurgião na zona de Chicago
cuja doença renal foi provocada pela diabetes. Não sem antes ter havido
uma discussão sobre o procedimento e os seus riscos no comité de ética
do hospital.
“Depois de numerosas discussões sobre este
procedimento, apresentámos ao Ray a opção de doar o seu rim a alguém que
estivesse na lista nacional de espera de rins, em vez de o deitar
fora”, conta Lorenzo Gallon.
Tanto Ray Fearing como a irmã
concordaram com o novo destino do rim. “Tinha de tirá-lo de qualquer
forma, por isso não havia razão para não o doar”, diz Ray Fearing. “Foi
uma bela surpresa. Pensava que o meu rim não prestava, porque não tinha
funcionado no meu irmão. O facto de o salvarem e de ter beneficiado
alguém deixa-me feliz”, acrescenta a irmã.
Tudo começou quando o
norte-americano Ray Fearing, recebeu o rim da irmã, ao fim de uma longa
batalha contra uma doença renal. Mas o transplante falhou e, em vez de o
deitar fora, aos primeiros sinais do regresso da doença, os médicos
decidiram dar o rim a outro doente, Erwin Gomez.
Quanto a Erwin
Gomez, não pensou duas vezes e trocou vários anos de espera por um
transplante por um rim parcialmente danificado. “Não tive dúvidas em
aceitar logo”, disse, segundo o jornal Chicago Sun-Times.
Avanço médico
Um
dos receios dos médicos antes da cirurgia era que os danos no rim
enquanto esteve no corpo de Ray Fearing fossem irreversíveis. Os receios
revelaram-se infundados: o rim recuperou a sua função pouco tempo
depois de Erwin Gomez o ter recebido e, oito dias mais tarde, os exames
mostraram que os danos desapareceram.
“Este é um avanço médico,
porque sugere que é possível reverter os danos num rim provocados pela
glomerulonefrite segmentar focal, depois de ser retransplantado num
corpo com um sistema circulatório saudável”, comenta, no mesmo
comunicado, outro cirurgião do hospital, Joseph Leventhal. “Não só
salvámos um órgão viável de ser descartado, como demos um passo
significativo na compreensão da causa da glomerulonefrite segmentar
focal, que é relativamente desconhecida, para podermos tratá-la melhor
no futuro. Isto prova que, quando um órgão falha num corpo, pode ter
sucesso noutro.”
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