SALVADOR NOGUEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Esta parece saída da ficção científica. Um grupo internacional de
cientistas, incluindo brasileiros, conseguiu pela primeira vez produzir e
capturar átomos inteiros feitos de antimatéria. Local do feito: a Cern
(Organização Europeia de Pesquisa Nuclear).
Apenas um punhado de anti-hidrogênio, é verdade, mas o suficiente para
entreabrir uma porta que pode levar a resultados um bocado importantes
na física.
Antimatéria parece um negócio tão estranho simplesmente porque ela não
costuma existir. Por alguma razão bizarra, o Universo é todo feito de
matéria convencional, feita de prótons de carga positiva e elétrons
negativos.
No começo de tudo, não deve ter sido assim. Acredita-se que o Big Bang
tenha criado também muita antimatéria --feita de antiprótons de carga
negativa e antielétrons (ou pósitrons) de carga positiva. Mas para onde
foram essas antipartículas todas?
Ocorre que, quando partículas e antipartículas se encontram, o resultado é a aniquilação completa de ambas.
Especula-se que, no Big Bang, a criação de matéria tenha sido um
pouquinho maior que a de antimatéria. Com isso, as colisões teriam dado
cabo de todas as antipartículas, e a "pouca" matéria remanescente é o
que vemos hoje na forma de galáxias, planetas e pessoas.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Moral da história: se você quer estudar antimatéria em laboratório, tem
de fabricá-la você mesmo. Mas o mais difícil, depois de obter algumas
partículas, é guardá-las.
Qualquer recipiente convencional teria de ser feito de matéria, e o mero
contato produziria a aniquilação total das antipartículas.
A única maneira de preservar a antimatéria é por meio de campos
magnéticos. ""É o que chamamos de armadilha magnética", conta Claudio
Lenz Cesar, físico da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Ele e seu ex-aluno de doutorado, Daniel de Miranda Silveira, agora
associado ao Laboratório de Física Atômica Riken, no Japão, foram os
dois brasileiros do trabalho.
As armadilhas magnéticas são bem eficientes para conter antiprótons ou
pósitrons isolados, que têm a mesma carga. Mas, quando você combina um
de cada e forma um átomo de anti-hidrogênio, o conjunto é neutro --muito
mais difícil de manipular por magnetismo.
A captura de antiátomos exige uma sintonia muito precisa do equipamento.
De milhões de partículas que começam o experimento, apenas uma ou duas
sobram.
Os resultados estão na última edição do periódico científico "Nature". A
ideia, agora, é estudar os antiátomos em busca de pistas sobre
propriedades fundamentais das partículas. No futuro, grandes quantidades
de antimatéria também poderiam servir como supercombustível. E o grupo
espera usar os antiátomos para investigar como a gravidade age sobre a
antimatéria. Especula-se que essas partículas possam reagir à gravitação
como uma força repulsiva, em vez de atrativa.
"Não é o que esperamos. Mas ainda falta fazer esse experimento", diz Cesar.
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